ÁFRICA E A GUERRA FRIA
Em 1945, terminada a 2ª Guerra
Mundial, os Estados Unidos da América (EUA) e a União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas (URSS) passaram a dominar as relações políticas
internacionais.
A aliança decisiva entre os EUA e a
URSS na vitória dos Aliados sobre o Nazismo, não resistiu até o termo da
guerra. Em nome da defesa do Capitalismo e do Socialismo, os EUA e a URSS
opuseram-se com tal violência, que cavam uma profunda divisão entre o Ocidente
e o Leste da Europa.
Nos países libertados pelo Exército
Vermelho, a URSS impôs a constituição de governos pro-soviéticos (Roménia,
Bulgária, Hungria, Polónia e Checoslováquia).
No ocidente, os EUA receosos com o
avanço comunista na Europa do Leste, tomam medidas para conter essa influência
e isolar a URSS e seus aliados; com esse objectivo, o governo americano anuncia
a Doutrina Truman e o Plano Marshall.
Aprendendo mais!
Doutrina Truman
Plano Marshall:
auxílio económico e técnico prestado pelo governo americano à Europa saída da
2ª Guerra Mundial, destinado a apoiar a sua reconstrução.
Deve
o seu nome ao do general americano George Marshall (1880-1959) que propôs em
Junho de 1943. Foi aplicado em 1947. O plano beneficiou 16 países, todos da
Europa Ocidental.
O
objectivo último deste plano era evitar que, numa Europa em crise, surgissem
tensões sociais que favorecem a proliferação de ideias comunistas.
Como resposta a estratégia
americana (Plano Marshall) para conter o Comunismo, a URSS cria a Kominform em
Setembro de 1947, órgão coordenador e dirigente dos partidos comunistas
europeus contra o imperialismo ocidental.
Em 1947, a ruptura entre os Aliados
é um facto, a Europa fica dividida em duas zonas de influência: a Ocidental sob a protecção dos EUA e a Oriental sob o controlo da URSS.
Além da Europa, as superpotências
lutavam por estender a sua influência e apoio nos novos estados pós-coloniais
da Ásia e África.
Desde então, cresce a rivalidade
entre os dois campos antagónicos, as superpotências passam a opor-se por vezes
violentamente, mas sem se envolverem directamente num confronto militar. Esta
oposição político-ideológica entre os mundos capitalista e comunista liderados
pelos EUA e URSS ficou conhecida por Guerra Fria.
A guerra permaneceu fria porque a
URSS não era expansionista e menos ainda agressiva. Esta potência desmobilizou
as suas tropas, reduzindo a força do Exército Vermelho de quase 12 milhões, em 1947,
para 3 milhões em fins de 1948
O confronto entre os dois blocos
inicia em 1948 com o bloqueio de Berlim (1948-49) e atinge o auge com a guerra
da Coreia (1950-53).
Bloqueio
de Berlim (1948)
Em 1945, a Conferência de Ialta
decide a divisão de Berlim em 4 zonas, repartidas pelos EUA, França, Inglaterra
e União Soviética. Em Junho de 1948
(após a unificação das três zonas das potências ocidentais), Estaline ordena o
corte de comunicações da cidade de Berlim com o resto da Alemanha (o Bloqueio
de Berlim). Em resposta, os EUA organizam o abastecimento da cidade por avião
(a ponte aérea).
Nos finais da década de 1940 e
quase toda década de 1950, a confrontação entre os EUA e a URSS intensifica-se.
Vive-se uma época de medo, de violenta competição a nível da espionagem e da
propaganda.
Guerra
da Coreia (1950-53)
Em 1945, conforme as decisões da
Conferência de Potsdan, a Coreia é ocupada a norte do paralelo 38° pela URSS e
a sul pelos EUA. Em 1950 (após a evacuação das tropas ocupantes), os dois
estados entram em guerra; a Coreia do Norte é apoiada pela China comunista (que
usou 150 aviões que na verdade eram aviões soviéticos com pilotos soviéticos) e
a Coreia do Sul pelos EUA. Em 1953, é assinado o armistício, que fixa a
demarcação entre as duas Coreias.
A Guerra Fria gerou consequências a nível social e político. No que
concerne ao primeiro, ela produziu movimentos internacionais de paz,
essencialmente dirigidos contra as armas nucleares, quanto ao nível político,
paralisou o mundo controlado pelas superpotências em dois blocos francamente
hostis – anti-comunista e pro-comunista:
a) a nível político
Os EUA com os seus aliados europeus
constituem, em 1949, uma grande
aliança defensiva, a NATO ou OTAN (Organização do Tratado Atlântico
Norte), pacto de defesa militar constituída pelos seguintes países: EUA,
Canadá, Bélgica, Dinamarca, França, Grã-Bretanha, Holanda, Islândia, Itália,
Luxemburgo, Noruega, Portugal, mais tarde a Grécia, a Turquia (1952), Alemanha
(1954) e Espanha (1982).
Em réplica à aliança ocidental, a
URSS assina com os países do leste, em 1955,
um tratado de assistência mútua, o Pacto
de Varsóvia – acordo militar. Faziam parte do tratado, os seguintes países:
URSS, Albânia até 1968, Bulgária, Checoslováquia, Hungria, Polónia e Roménia e
a República Democrática Alemã (1956).
b) a nível económico
Os países da Europa Ocidental
criaram em 1948, OECE (Organização Europeia de Cooperação Económica) para
administrar os fundos do Plano Marshall.
Os países do Leste criam, em 1949,
o COMECON (Conselho de Ajuda Económica Mútua) para coordenar as suas economias.
A Coexistência
Pacífica, década de 1960
No início dos anos 60, a Guerra Fria pareceu dar alguns passos
hesitantes em direcção à sanidade, ficando conhecido este período de Coexistência Pacífica.
Aprendendo mais!
Ao
longo dos anos 50, os EUA detêm a supremacia no domínio das armas estratégicas.
Já na década de 1960, o poderio do arsenal atómico de cada superpotência é tão
considerável que ambos estão em condição de se destruírem mutuamente – é o
chamado equilíbrio de terror, corrida
ao armamento por parte das superpotências no sentido de conseguirem tal poderio
militar, nomeadamente, a nível nuclear que, constituísse um factor de dissuasão
de um ataque armado por parte de outra potência. Em caso de conflito directo,
as perdas para ambas partes (e para o mundo) seria de tal modo elevadas que
ninguém sairia verdadeiramente vencedor.
Em
1963, após momentos de grande tensão entre o Leste e o Ocidente – a construção
do Muro de Berlim (1961) e a Crise de Mísseis em Cuba (1962) –
inicia-se uma nova etapa nas relações internacionais, a Coexistência Pacífica, novo relacionamento entre o Ocidente e o
Leste, inaugurado pelo líderes soviético e americano, Nikita Krutchev
(1894-1971), 1º Secretário do Partido Comunista Soviético e Eisenhower,
presidente dos EUA entre 1953-1961, respectivamente, em que se pretendeu
fomentar o diálogo e o entendimento entre os EUA e a URSS.
Krutchev
e Eisenhower reunem-se pela primeira vez em Genebra (1955). O líder soviético
visita os EUA (1959). Em 1963, Moscovo e Washington ligam-se pelo telefone
vermelho para uma rápida discussão dos problemas internacionais.
Alguns factores que contribuíram
para abaixar as tensões da Guerra Fria:
ü O
ocidente capitalista sentia estar a perder terreno para as economias comunistas
que haviam crescido mais rapidamente que a sua nos anos 50;
ü A
URSS estava preocupada não só com as ameaças demasiada belicosa de Washington,
mas também com a ruptura fundamental com a China que acusava Moscovo de
amolecimento face ao capitalismo;
ü A
súbita aceleração da descolonização e revolução no Terceiro Mundo pareceu
favorecer os soviéticos. Os EUA nervosos, mas confiantes, enfrentavam assim uma
URSS confiante, mas nervosa na questão de Berlim, do Congo, de Cuba.
A década de 60 marcou o período de aproximação, diálogo e acordos entre
os EUA e a URSS:
ü foi
nesta década que houve a instalação da linha quente
telefónica (1963) que então
passou a ligar a Casa Branca ao Kremlin;
ü a
construção do muro de Berlim (1961) fechou a última fronteira indefinida
entre o Oriente e Ocidente na Europa;
ü os
americanos aceitaram uma Cuba comunista;
ü as
pequenas chamas de guerra e de guerrilha acendidas pela Revolução Cubana na
América Latina, e pela onda de descolonização na África, não se transformaram
em incêndios, antes pareceram extinguir-se;
ü os
anos 60 e início dos 70 testemunharam realmente algumas medidas significativas
para controlar e limitar as armas nucleares: um Tratado de Armas Estratégicas
(SALT-1972 e 1979) entre os EUA e a URSS;
ü alguns
acordos sobre os Mísseis Anti-balísticos (ABMS)[1] de
cada lado;
ü o
comércio entre os EUA e a URSS politicamente estrangulado de ambos lados por
tanto tempo, começou a florescer à medida que os anos 60 viravam para os 70: Conferência
de Helsínquia (1975), capital da Finlândia – declaração de princípios
sobre cooperação económica e técnica, segurança internacional e respeito pelos
direitos humanos, assinado pelos países membros da NATO e do Pacto de Varsóvia.
Apesar de um nítido esforço de apaziguamento
e entendimento nas relações américo-soviéticas, ocorrem ainda alguns conflitos
regionais:
ü a
Guerra do Vietname (1960-1973), travada entre o Vietname do Norte, abastecido
em armamento pela URSS e China e o Vietname do Sul, apoiado maciçamente em
armas e soldados pelos EUA;
ü a
Guerra do Afeganistão (1979-1988);
ü a
Guerra Irão-Iraque (1980-1988).
Neutralismo do Terceiro
Mundo
Nas décadas de 1950 e 1960, a
maioria das colónias europeias na Ásia e em África ascendem à independência. Os
novos países assumem uma posição de neutralismo face ao afrontamento entre os
blocos americano e soviético (BURNS, 1979).
O não-alinhamento nasceu
efectivamente na época da Guerra Fria, no momento dos mais rudes enfrentamentos
entre o Oeste e o Leste. Em 1961, realizou-se em
Belgrado (Jugoslávia), a Primeira Conferência dos Países Não-alinhados, que
convergiam na busca de um caminho próprio nas relações internacionais. Tendo
como principais articuladores Tito (Jugoslávia), Nasser (Egito), Nehru (Índia)
e Sukarno (Indonésia), os participantes da reunião elaboraram as bases de sua
orientação política. Eles rejeitavam a divisão do mundo em dois blocos feita
pela Guerra Fria e postulavam uma
nova ordem económica internacional mais justa. O Movimento dos Não-Alinhados
fez reuniões sucessivas, para aprofundar suas convicções políticas (luta contra
o imperialismo, colonialismo, neocolonialismo, racismo, bem como contra
qualquer tipo de agressão ou dominação externa) e debater questões económicas,
como o preço das matérias-primas, o desenvolvimento e a dívida externa.
Diversos países africanos participaram destas actividades. Ele tornou-se, muito rapidamente,
o ponto de união para o conjunto dos países do Terceiro Mundo, os quais
totalizavam 95 representantes por ocasião da conferência de Havana, em 1979. Na
África, o não-alinhamento desenvolveu-se precocemente em razão do fracasso do
movimento afro-asiático, após a conferência de Bandung (1955). O
não-alinhamento está explicitamente inscrito na Carta da OUA (1963). Entretanto,
os critérios do não-alinhamento − “seguir uma política independente, fundada na
coexistência pacífica” − eram suficientemente indefinidos a ponto de ter sido
possível interpretá-los com tal flexibilidade que ele, ao contentar gregos e
troianos, enfraqueceu singularmente o seu próprio significado, em razão de uma
aplicação cada vez mais laxista (assim, a interdição do estabelecimento de uma
aliança militar bilateral com uma grande potência era, naqueles tempos, pouco
respeitada do lado Oeste e Leste) (COQUERY-VIDROVITCH, 2010:367-368).
Percurso do fim da
Guerra Fria
Em meados da
década de 1980, com a subida de Mikhail Gorbatchev ao poder na
URSS que inicia com suas reformas Perestroika
(reestruturação) que, visava entre outros: acelerar o progresso económico e
social da URSS; aprofundar a democracia, instituir a transparência (Glasmost) nas relações entre o Estado e
os cidadãos; encorajar a iniciativa privada e a criatividade individual – e, a
reeleição de Ronald Reagan presidente dos EUA, afirma-se disposto a iniciar uma
era de entendimentos nas relações com a URSS. Então, realizam-se uma série de
cimeiras que conduziram à aproximação sem precedentes entre os EUA e a URSS:
ü a
Cimeira de Washington (Dezembro de 1987) em que se assina o Acordo INF[2]
que põe fim aos mísseis intermédios na Europa;
ü a
Cimeira de Malta (Dezembro de 1989), que marca o estreitamento decisivo da
cooperação EUA-URSS a todos os níveis de intervenção e actuação.
A adopção, por Moscovo, de uma
política de abertura e desanuviamento provocou profundas transformações na
Europa:
ü o
colapso dos regimes comunistas da Europa do Leste (2º semestre de 1989), sob
pressão popular e com o beneplácito de Moscovo, os governos comunistas do Leste
europeu caem um a um. No seu lugar começam a ser estabelecidos regimes
democráticos do tipo ocidental na Polónia, Hungria, Checoslováquia;
ü a
queda do Muro de Berlim (09 de Dezembro de 1989) assinala para a posteridade o fim
da Guerra Fria e do conflito Leste-Oeste.
A nível da política interna, a
queda do muro conduziu ao fim do próprio regime comunista na República
Democrática Alemã e, a 03 de Outubro de 1990, à reunificação da Alemanha
(BURNS, 1979).
ÁFRICA
E A GUERRA FRIA: MANIFESTAÇÕES
A
crise económica que abalou a África na década de 70 foi acompanhada por uma
epidemia de conflitos armados, entre e nas próprias sociedades africanas, que
agravou a tendência em direcção à instabilidade e insegurança no continente.
Dois destes confrontos, a guerra civil no Chade e a rivalidade entre Marrocos e
Argélia sobre o antigo Saara Espanhol reduziram a cinzas o ideal pan-africano
da inviolabilidade das fronteiras e da soberania dos estados pós-colonial. Pior
ainda, o novo despertar de violência nos anos 70 teve como consequência a
situação que a OUA lutara com tanta força (e sucesso) para evitar: a expansão
da Guerra Fria para a África.
Repentinamente, a União Soviética surgiu no cenário africano, sendo
inevitavelmente seguida pelos Estados Unidos, o que levou, em breve, ambas as
superpotências a cortejar os seus clientes e a empregar procuradores à medida
que a sua rivalidade global se expandia para o continente (KEYLOR, 2001:470).
A descolonização política da África
finalmente provocou o enfraquecimento do protectorado da OTAN, transformado em
hegemonia da OCDE. Contribuíram, a este respeito, dois vectores principais. Primeiramente,
enquanto os Estados africanos diversificavam as suas relações económicas com o
restante do mundo, outros países capitalistas membros da OCDE, embora não
pertencentes a OTAN (como a Suíça, a Irlanda, a Suécia e o Japão),
estabeleceram sólidos laços económicos com a África. Em segundo lugar,
fornecendo apoio material aos movimentos africanos de descolonização, o bloco
soviético adquiriu crescente influência na África, influencia a actuar,
parcialmente, em detrimento do protectorado da OTAN. Nos anos 1960,
inicialmente apoiado sobre a declarada amizade, embora verbal, dos regimes
radicais no poder em Gana, na Guiné e no Congo Brazaville, o bloco soviético
havia, posteriormente, em meados dos anos 1970, estabelecido sólidas pontas‑de‑lança na Etiópia, em Angola e
Moçambique, autoproclamados Estados Socialistas ou marxistas pro-soviéticos
(CHINWEIZU,
2010:933).
Acções
dos países ocidentais no combate contra a instalação de regimes pro-soviéticos em
África
Os temores, suscitados no Ocidente
pela influência do bloco soviético na África, tiveram sérias repercussões nas
relações afro‑ocidentais. As
acções e intenções soviéticas tornaram‑se elemento crucial dos cálculos
dos ocidentais e dos africanos, em referência a todos os aspectos das suas
relações (CHINWEIZU, 2010:933).
Os países ocidentais esforçaram-se para isolar a África da influência
do bloco soviético, ao passo que o nacionalismo africano estava distante de
ignorar a ajuda que este mesmo bloco poderia conceder‑lhe em seu combate contra a supremacia dos colonos
rodesianos no Zimbabué, contra o colonialismo português em Angola, na Guiné-Bissau e Moçambique, contra o
domínio sul‑africano na Namíbia e contra o apartheid e o poder dos colonos brancos na
África do Sul.
Para ganhar influência nesta região
de africana, Ocidente apoiou, integralmente e com toda a sua força, os
sobreviventes regimes colonialistas de Portugal, da Rodésia e da África do Sul.
Nos Estados africanos
independentes, o protectorado da OTAN foi preservado de diversas maneiras:
campanhas de propaganda destinadas a promoverem o clima político e cultural pro‑ocidental e anti-soviético; apadrinhamento político dos
regimes africanos através das embaixadas ocidentais; intervenções políticas
secretas e, caso fracassassem estas acções, intervenções militares directas, em
apoio aos regimes pro‑ocidentais vacilantes ou intuindo
derrubar regimes pro-soviéticos cujo estabelecimento estivesse consumado. Estas
actividades culminaram com as múltiplas intervenções militares “anti-comunistas”,
executadas na África por forças ocidentais ou subservientes. Entre estas
intervenções, devemos citar: a operação da ONU na República Democrática do
Congo (ex‑Zaire), entre 1960 e 1964, cujo
objectivo consistia em banir Patrice Lumumba, a oeste considerado pro-soviético e comunista, instalando
assim um regime pro‑ocidental; as intervenções
britânicas no Quénia e na Tanganyika (1964), com o intuito de reprimir
sublevações contra os regimes pro‑ocidentais; o golpe de Estado
contra Nkrumah em Gana (1966), objectivando derrubar um chefe de Estado
progressivamente anti-ocidental; as operações do Shaba em 1977 e 1978‑1979, com vistas a proteger o regime de Mobutu contra os
inimigos congoleses; numerosas intervenções francesas visando apoiar os regimes
pró-Paris
(na Costa do Marfim em 1964 e 1968, por exemplo) ou para substituírem aqueles
não mais aceitos pela França, como o Golpe de Estado contra o imperador Bokassa
(1979); além de múltiplas expedições de mercenários, cujo plano consistia em derrubar
governos africanos “esquerdizantes”, a imagem da Guiné (1970) e das Seychelles
(1979 e 1982). Estes procedimentos permitiram preservar, em termos gerais, um statu quo pro‑ocidental nos países em questão (Chinweizu, 2010:934-935).
A rivalidade entre o leste e o
oeste na África Austral
O anti-comunismo e a hostilidade em
relação a União Soviética, na África Austral tiveram o apoio dos regimes
racistas da Rodésia e da África do Sul. Em Fevereiro de 1956, o governo de
Pretoria fechou os consulados soviéticos na União Sul-Africana. A tendência em
identificar o comunismo interno com uma “traição” tornou-se característica da
paranóia dos regimes da África Austral. Na África do Sul, ela provocou ruidosos
processos, por “traição”, e outros que tais contra o comunismo. O poder
organizou, notadamente, processos colectivos por “traição” envolvendo
africanos, asiáticos e europeus em luta contra o apartheid. Abram Fischer, advogado da Coroa,
julgado e condenado a prisão perpétua, em Março de 1966, na cidade de Pretória,
por comunismo (CHANAIWA, 2010:329-330).
Apesar da retirada dos consulados
soviéticos da União Sul-Africana, um após o outro, os países africanos que
acabavam de conquistar a sua independência, estabeleceram relações diplomáticas
com a URSS. No transcorrer deste período a presença diplomática soviética no
continente deslizou inexoravelmente para o sul. Em meados dos anos de 1960, a
União Soviética estava representada em Lusaka, na linha de frente. Em meados
dos anos 1970, a presença diplomática soviética ganhara ainda maior força rumo
ao sul, alcançando uma estatura antes jamais vista. Maputo e Luanda tornaram-se,
por algum tempo, dois dos mais confiáveis aliados africanos da URSS e, não sem
hesitação, repúblicas marxistas-leninistas autoproclamadas. Do ponto de vista
estratégico ocidental, a África Austral estava novamente ameaçada.
A rivalidade entre o leste e o
oeste cristalizou-se em torno da questão da presença soviética e cubana em
Angola. A guerra entre o MPLA, no poder, e a UNITA, liderada por Jonas Savimbi,
se internacionalizara; Cuba e a União Soviética apoiando o partido no governo,
cabendo a África do Sul e aos Estados Unidos da América, por sua vez, financiar
e tentar fortalecer a UNITA. O futuro da Namíbia encontrava-se sob fogo cruzado,
sobretudo quando a África do Sul e os Estados Unidos da América subordinaram publicamente
a sua independência a retirada das tropas cubanas de Angola. O MPLA considerou
esta condição como uma afronta a soberania angolana. Quanto a SWAPO,
naturalmente, ela replicou argumentando que o direito da Namíbia a
autodeterminação não poderia depender, como um refém, do jogo das
superpotências na vizinha Angola. Até o fim dos anos 1980, a questão da
independência da Namíbia permaneceu em um total impasse, em virtude do jogo de
xadrez estratégico que opunha, na África Austral, a União Soviética aos Estados
Unidos da América. Somente a política da perestroika, conduzida por Mikhail Gorbatchev
e a política de distensão dos conflitos regionais, sustentada pela perseverança
do americano Chester Crocker, permitiram, finalmente, as partes alcançarem a
conclusão de um acordo em 1988-1989 (Ibid:330).
A
presença soviética na região, no entanto, estimulava os EUA a apoiar o regime
ditatorial de Mobutu no Zaire, a guerrilha da UNITA em Angola e o Apartheid na
África do Sul (SILVA, 2005:10).
Depois
da derrota da batalha de Cuito-Cuinavale sofrida pelos sul-africanos para
tropas cubano-angolanas, em 1988, os EUA e a África do Sul decidiram negociar a
pacificação. Os Estados Unidos propuseram a retirada cubana em troca da
independência da Namíbia (que era ocupada pela África do Sul e utilizada como
ponta de lança para atacar Angola)[3].
Em 1989, os cubanos retiraram-se de Angola e da Etiópia e iniciou-se o processo
de independência da Namíbia, concluído em 1990 (SILVA, 2005:12-13).
A
URSS, Cuba e outros países socialistas, apoiaram os países da linha de frente[4] que,
depois da independência da Rodésia do Sul tinham como objectivos a eliminação
do Apartheid e da agressão
sul-africana e o desenvolvimento das jovens nações africanas de forma
independente (SILVA, 2005:10).
As tentativas ocidentais visando
impedir a instalação de regimes pro-soviéticos, nas derradeiras antigas
colónias, obtiveram êxito muito inferior. Nestas condições, o nacionalismo
africano, com o decisivo apoio do bloco soviético, infringiu derrotas ao
Ocidente.
Bibliografia
BURNS, Eduard McNall. História da Civilização Ocidental. 22ª
edição. Porto Alegre: Globo. 1979.
COQUERY-VIDROVITCH, Catherine. As mudanças económicas na África em seu contexto mundial (1935-1980). In: In: MAZRUI,
Ali A., WONDJI, Christophe (Ed.). História
Geral da África, VIII: África desde 1935. Brasília: UNESCO, 2010. pp. 337-376.
SILVA,
André Luiz Reis da. África contemporânea: os novos desafios da
segurança, desenvolvimento e autonomia (1960-2005). Monographia, Porto Alegre, n. 1, 2005. Disponível em:<http://www.fapa.com.br/monographia>
[1] Um míssil anti-balístico
é um míssil projectado para destruir
mísseis balísticos, também sendo chamado de mísseis de defesa de mísseis ou
míssil antimísseis. Um míssil balístico é utilizado para intoxicação em massa,
ou até mesmo destruição em massa usando ogivas que podem ser nucleares, mas o comum são químicas, biológica, apresentando uma
trajectória de voo balístico pelas camadas mais altas
da terra e até mesmo pelo espaço, não dando chances para aviões impedir ou até
mesmo detectar o ataque. O termo "míssil anti-balístico" descreve
qualquer sistema de mísseis antimísseis projectado para combater mísseis
balísticos. No entanto, o termo é usado mais comummente para os sistemas
destinados a combater à longa distância o míssil balístico intercontinental lançado pelo adversário.
[2] O acordo de Forças
Nucleares Intermediárias (INF, na sigla em inglês) foi assinado entre Mikhail
Gorbachev e Ronald Reagan em 1987. Previa a remoção de parte do arsenal nuclear
de EUA e União Soviética com fins de conter a ameaça para a segurança global
representada pelas duas superpotências. Considerado o "começo do fim da
Guerra Fria," o Tratado INF proibiu possuir, produzir e testar mísseis
nucleares de distância intermediária (entre 500 e 5,5 mil km).
[3] Ver resolução 435 das Nações
Unidas.
[4] Após a
descolonização da África portuguesa em 1974/75, formou-se um grupo de países de
orientação progressista, denominado países da linha de frente (envolvendo
Zâmbia, Angola, Botsuana, Moçambique e Tanzânia) cujo objectivo central era a
critica aos regimes racistas da Rodésia e da África do Sul, que também ocupava
a Namíbia e, através dela, promovia ataques aos outros países da região.
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